Na escrita acadêmica, é comum cair na armadilha de produzir parágrafos longos, cheios de palavras, mas com pouco conteúdo real. Muitas vezes, sem perceber, o autor preenche espaços com frases que soam importantes, mas que não contribuem de fato para o avanço do argumento ou da discussão. E é aí que surge uma pergunta essencial: isso que estou escrevendo realmente importa?

Ao redigir ou revisar seu artigo científico, você deve se acostumar a fazer a si mesmo uma pergunta simples, mas poderosa: “E daí?”

Essa pergunta é um convite à reflexão crítica sobre o valor do que está sendo dito. Não basta afirmar um dado, apresentar um resultado ou citar uma referência — é preciso deixar claro por que isso é relevante, qual é o impacto dessa informação, e como ela se conecta ao seu objetivo de pesquisa.

Exemplo de um trecho fraco:

“A taxa de resposta ao tratamento foi de 78%, o que mostra um bom desempenho do protocolo.”

Pergunta: e daí?

  • 78% é considerado um bom valor comparado a quê?
  • Isso é melhor ou pior que tratamentos anteriores?
  • Esse resultado muda alguma recomendação clínica?

Melhoria possível:

“A taxa de resposta de 78% observada neste estudo supera os 65% reportados por protocolos anteriores, sugerindo que o novo esquema terapêutico pode representar uma opção mais eficaz para pacientes refratários.”

Neste exemplo, o autor não apenas apresenta um dado, mas interpreta e contextualiza o resultado — tornando claro o seu significado.

Na busca por cumprir limites mínimos de palavras ou por parecer mais “acadêmico”, muitos autores acabam adicionando trechos redundantes ou genéricos, que não agregam valor. Esse conteúdo é conhecido como filler — ou, em bom português, “encheção de linguiça”.

Frases como:

  • “É importante destacar que a literatura é vasta.”
  • “Estudos diversos mostram a relevância do tema.”
  • “A pesquisa científica tem um papel fundamental na sociedade.”

Todas essas frases dizem muito, mas explicam pouco. Elas apenas ocupam espaço e deixam o texto cansativo.

Como evitar esse problema? Ao revisar seus parágrafos, pratique as seguintes estratégias:

  1. Pergunte “Qual é o ponto aqui?”
  2. Se você não consegue resumir o objetivo central do parágrafo em uma frase, talvez ele esteja vago ou disperso.
  3. Relacione cada ideia ao seu objetivo de pesquisa
  4. Todo dado apresentado deve ajudar a responder sua pergunta de pesquisa ou a sustentar sua hipótese.
  5. Escreva como se o leitor não tivesse tempo a perder
  6. A clareza e a objetividade tornam o texto mais convincente. Seja direto, mas não superficial.
  7. Evite o óbvio
  8. Se uma afirmação é amplamente conhecida ou não é necessária para o raciocínio do artigo, talvez possa ser retirada.
  9. Antecipe perguntas do leitor
  10. Um bom texto científico responde às dúvidas do leitor antes mesmo que ele as formule.

Escolha um parágrafo do seu artigo (pode ser da introdução, discussão ou conclusão) e faça estas perguntas:

  • O que estou dizendo aqui?
  • Por que isso é importante?
  • Como isso se relaciona com meu argumento principal?
  • O que meu leitor vai ganhar ao ler este parágrafo?

Depois, revise o trecho para garantir que essas respostas estejam claras no texto. Seu objetivo deve ser transformar qualquer informação isolada em parte de um argumento maior e coerente.

Conclusão: toda palavra deve ter uma função. A escrita científica não é um exercício de quantidade, mas de qualidade. Um artigo relevante não é aquele que ocupa mais páginas, mas o que consegue comunicar ideias complexas de forma clara, direta e fundamentada.

Cada parágrafo, cada frase — até mesmo cada palavra — deve ter uma função. Se não tiver, repense, reescreva ou simplesmente elimine.

Lembre-se: escrever bem é respeitar o tempo do seu leitor e valorizar sua própria pesquisa.


Silvana B. Marchioro